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domingo, 24 de junho de 2012

DECLARAÇÃO FINAL CÚPULA DOS POVOS NA RIO+20 POR JUSTIÇA SOCIAL E AMBIENTAL



DECLARAÇÃO FINAL
CÚPULA DOS POVOS NA RIO+20 POR JUSTIÇA SOCIAL E AMBIENTAL
EM DEFESA DOS BENS COMUNS, CONTRA A MERCANTILIZAÇÃO DA VIDA


Movimentos sociais e populares, sindicatos, povos e organizações da sociedade civil de todo o mundo presentes na Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, vivenciaram nos acampamentos, nas mobilizações massivas, nos debates, a construção das convergências e alternativas, conscientes de que somos sujeitos de uma outra relação entre humanos e humanas e entre a humanidade e a natureza, assumindo o desafio urgente de frear a nova fase de recomposição do capitalismo e de construir, através de nossas lutas, novos paradigmas de sociedade.
A Cúpula dos Povos é o momento simbólico de um novo ciclo na trajetória de lutas globais que produz novas convergências entre movimentos de mulheres, indígenas, negros, juventudes, agricultores/as familiares e camponeses, trabalhadore/as, povos e comunidades tradicionais, quilombolas, lutadores pelo direito a cidade, e religiões de todo o mundo. As assembléias, mobilizações e a grande Marcha dos Povos foram os momentos de expressão máxima destas convergências.
As instituições financeiras multilaterais, as coalizões a serviço do sistema financeiro, como o G8/G20, a captura corporativa da ONU e a maioria dos governos demonstraram irresponsabilidade com o futuro da humanidade e do planeta e promoveram os interesses das corporações na conferência oficial. Em constraste a isso, a vitalidade e a força das mobilizações e dos debates na Cúpula dos Povos fortaleceram a nossa convicção de que só o povo organizado e mobilizado pode libertar o mundo do controle das corporações e do capital financeiro.
Há vinte anos o Fórum Global, também realizado no Aterro do Flamengo, denunciou os riscos que a humanidade e a natureza corriam com a privatização e o neoliberalismo. Hoje afirmamos que, além de confirmar nossa análise, ocorreram retrocessos significativos em relação aos direitos humanos já reconhecidos. A Rio+20 repete o falido roteiro de falsas soluções defendidas pelos mesmos atores que provocaram a crise global. À medida que essa crise se aprofunda, mais as corporações avançam contra os direitos dos povos, a democracia e a natureza, sequestrando os bens comuns da humanidade para salvar o sistema economico-financeiro.
As múltiplas vozes e forças que convergem em torno da Cúpula dos Povos denunciam a verdadeira causa estrutural da crise global: o sistema capitalista associado ao patriarcado, ao racismo e à homofobia.

As corporações transnacionais continuam cometendo seus crimes com a sistemática violação dos direitos dos povos e da natureza com total impunidade. Da mesma forma, avançam seus interesses através da militarização, da criminalização dos modos de vida dos povos e dos movimentos sociais promovendo a desterritorialização no campo e na cidade.
Avança sobre os territórios e os ombros dos trabalhadores/as do sul e do norte. Existe uma dívida ambiental histórica que afeta majoritariamente os povos do sul do mundo que deve ser assumida pelos países altamente industrializados que causaram a atual crise do planeta.
O capitalismo também leva à perda do controle social, democrático e comunitario sobre os recursos naturais e serviços estratégicos, que continuam sendo privatizados, convertendo direitos em mercadorias e limitando o acesso dos povos aos bens e serviços necessários à sobrevivencia.
A atual fase financeira do capitalismo se expressa através da chamada economia verde e de velhos e novos mecanismos, tais como o aprofundamento do endividamento público-privado, o super-estímulo ao consumo, a apropriação e concentração das novas tecnologias, os mercados de carbono e biodiversidade, a grilagem e estrangeirização de terras e as parcerias público-privadas, entre outros.
As alternativas estão em nossos povos, nossa história, nossos costumes, conhecimentos, práticas e sistemas produtivos, que devemos manter, revalorizar e ganhar escala como projeto contra-hegemônico e transformador.
A defesa dos espaços públicos nas cidades, com gestão democrática e participação popular, a economía cooperativa e solidária, a soberania alimentar, um novo paradigma de produção, distribuição e consumo, a mudança da matriz energética,  são exemplos de alternativas reais frente ao atual sistema agro-urbano-industrial.
A defesa dos bens comuns passa pela garantia de uma série de direitos humanos e da natureza, pela solidariedade e respeito às cosmovisões e crenças dos diferentes povos, como, por exemplo, a defesa do “Bem Viver” como forma de existir em harmonia com a natureza, o que pressupõe uma transição justa a ser construída com os trabalhadores/as e povos. A construção da transição justa supõe a liberdade de organização e o direito a contratação coletiva e políticas públicas que garantam formas de empregos decentes.
Reafirmamos a urgência da distribuição de riqueza e da renda, do combate ao racismo e ao etnocídio, da garantia do direito a terra e território, do direito à cidade, ao meio ambiente e à água, à educação, a cultura, a liberdade de expressão e democratização dos meios de comunicação, e à saúde sexual e reprodutiva das mulheres.
fortalecimento de diversas economias locais e dos direitos territoriais garantem a construção comunitária de economias mais vibrantes. Estas economias locais proporcionam meios de vida sustentáveis locais, a solidariedade comunitária, componentes vitais da resiliência dos ecossistemas. A maior riqueza é a diversidade da natureza e sua diversidade cultural associada e as que estão intimamente relacionadas.
Os povos querem determinar para que e para quem se destinam os bens comuns e energéticos, além de assumir o controle popular e democrático de sua produção. Um novo modelo enérgico está baseado em energias renováveis descentralizadas e que garanta energia para a população e não para corporações.
A transformação social exige convergências de ações, articulações e agendas comuns a partir das resistências e proposições necessárias que estamos disputando em todos os cantos do planeta. A Cúpula dos Povos na Rio+20 nos encoraja para seguir em frente nas nossas lutas.
Rio de Janeiro, 15 a 22 de junho de 2012.
Comitê Facilitador da Sociedade Civil na Rio+20 - Cúpula dos Povos

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Relator muda texto do PNE !


Relator muda texto e investimento em educação pode chegar a 10% do PIB
  • Alexandra Martins/Ag. Câmara
    O deputado Angelo Vanhoni (PT-PR), relator do PNE
    O deputado Angelo Vanhoni (PT-PR), relator do PNE

O relator do PNE (Plano Nacional de Educação), deputado Angelo Vanhoni (PT-PR), anunciou nesta quarta-feira (13) que fez duas modificações de última hora no texto: subiu a meta de investimento em educação de 7,5% para 8% do PIB (Produto Interno Bruto) e criou a possibilidade de elevar esse percentual a 10%, caso metade dos recursos do pré-sal, a serem investidos na área, representem 2% do total.
Hoje, a comissão especial da Câmara que analisa o PNE aprovou o texto base do plano, com os 8% e votos contra do Psol e do PDT. O plano estabelece 20 metas educacionais que o Brasil deverá atingir até 2020. Porém, o patamar de investimento só deverá ser decidido de forma definitiva no dia 26, quando destaques sobre o tema deverão ser votados. Parlamentares e grupos da sociedade civil devem tentar alterar a meta de 8% para 10%, sem que haja a necessidade de uso de 50% do pré-sal. 
Há 160 destaques a serem votados no dia 26. O plano tramita em caráter conclusivo, sem necessidade de passar pelo plenário da Câmara antes de seguir para o Senado. Porém, caso haja algum recurso, o texto pode ir à votação no plenário.

Mudanças no investimento

As mudanças foram feitas de ontem (12) para hoje, após pressão de movimentos sociais. Vanhoni determinou que o investimento mínimo será de 8%. Porém, ele incluiu um artigo no texto do PNE estabelecendo que 50% dos recursos do pré-sal, incluindo os royalties, deverão ser utilizados diretamente em educação “para que, no final de dez anos de vigência do PNE, seja atingido o percentual de 10% do PIB para investimento em educação pública”.
Ou seja: tecnicamente, Vanhoni criou um "gatilho", que permite que o montante suba de 8% para 10%, caso metade dos recursos do pré-sal equivalham a 2%.  “Infelizmente, essa discussão ficou muito politizada [dos 10% do PIB para educação] porque senão tenho certeza que à luz da razão e dos dados técnicos nós chegaríamos a um acordo e votaríamos por unanimidade”, disse o relator.
Atualmente, o país aplica 5,1% do PIB em educação. 
"A mudança veio de uma pressão das entidades. Mas a gente ainda entende que é importante colocar dez por cento na meta", afirma Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Ainda dentro da meta de investimento, o texto aprovado hoje traz também como um dos objetivos do PNE a implementação do CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial), que determina um mínimo de investimento por aluno para a criação de um padrão mínimo de qualidade. Esse custo leva em conta diversos fatores, como número de alunos por turma, salário docente e insumos para utilização em sala de aula.
(Com informações da Agência Brasil)

terça-feira, 12 de junho de 2012

A proliferação do W no nome de crianças e jovens futebolísticos!


A revoada de dáblios no futebol


Esta inflação de nomes dabliados no futebol não é apenas uma piada. É também uma pista do que pensava o brasileiro uns vinte e cinco anos atrás. Ele queria que seus filhos fossem mais ricos, mais poderosos, mais internacionais. Queria que fossem vencedores no mundo.

A letra “W” voltou recentemente ao alfabeto brasileiro. Mas nunca deixou de estar presente nos campos de futebol. 

Desde Wendell, goleiro da década de 70 que passou por Santa Cruz, Botafogo, Fluminense e seleção brasileira, sempre houve alguns sujeitos com nomes começados com a letra “W”. Só que nunca foram tantos como agora.

Fiquei até me perguntando se seria possível fazer um time apenas com jogadores de nomes dabliosos que atuam na Série A do Brasileiro.

Mal comecei a pesquisa e achei o goleiro perfeito: Wewerton, do Atlético Goianiense, com dois dáblios.

Para as vagas nas laterais temos três concorrentes: Welder (Corinthians), Welington (Flamengo) e Wallace (Fluminense).

Zagueiros? Podemos fazer uma dupla de Wellingtons, pegando o do Flamengo e o do Fluminense, ou uma dupla de nomes curiosos, formada por Werley (Grêmio) e Wescley (Ponte Preta).

Os volantes seriam Wiliam Magrão (Cruzeiro) e Wesley (Palmeiras). E seus reservas, Wellington (São Paulo) e Welton (Sport).

Os dois meias poderiam William Farias (Coritiba) e Wagner (Fluminense). 

Por fim, poderíamos nos dar ao luxo de escolher um ataque wellingtônico, com Wellington Paulista (Cruzeiro) e Wellington Nem (Fluminense) ou uma linha de frente williâmica [temos um Willian (com “n”) no Atlético Goianiense, um William (com “m”) no Corinthians, um Williams (com “s”) no Sport e William José, do São Paulo]. Caso você não goste de nomes repetidos, pode ficar com Walter e Wallyson, ambos do Cruzeiro.

O técnico deste time, obviamente, seria Wanderley Luxemburgo.

Esta revoada de dáblios não é apenas divertida. Ela também pode indicar alguma coisa. Pode indicar um certo desejo de ser diferente, de ser globalizado, de subir na vida.

O dáblio é uma letra ligada às línguas alemã e inglesa. A Alemanha é o país mais rico da Europa e os EUA são o país mais poderoso do mundo. Ou seja, é uma letra ligada ao poder, à riqueza, e muitos pais devem acreditar que nomes iniciados pelo internacional “W” podem ajudar seus filhos a subirem na vida. 

Outra explicação é que o dáblio é uma letra diferente, esquisita, e assim, colocando-a num nome, seu proprietário fica mais mais individualizado. Provavelmente foi por isso que Vanderlei Luxemburgo esqueceu sua certidão de nascimento, colocando um “W” e um “Y” no lugar de reles ves e is. 

Esta inflação de nomes dabliados no futebol não é apenas uma piada. É também uma pista do que pensava o brasileiro uns vinte e cinco anos atrás. Ele queria que seus filhos fossem mais ricos, mais poderosos, mais internacionais. Queria que fossem vencedores no mundo. Ou “winners in the world”, como se diz na língua de Shakespeare (que por sinal chamava-se William).

Mas hoje os jogadores não estão mais tão ansiosos por jogar em países onde o “W” é comum. Aliás, alguns dáblios estão até voltando, como o habilidoso Wagner, que começou no América mineiro, passou por Arábia, Rússia e Turquia, e hoje está no Fluminense. 

Talvez num breve futuro acreditemos mais no Brasil e tenhamos Uilians e Uelintons desfilando pelos gramados nacionais. Talvez até uns Ubirajaras.

José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça (Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para o Jornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e tevê, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Estados e municípios não investem na Educação o minimo previsto em Lei Federal


52 cidades não usam o mínimo em educação
Dois Estados também investem menos que os 25% exigidos pela Constituição Federal

FLÁVIA FOREQUE

DE BRASÍLIA

Em 2010, 52 cidades e dois Estados não aplicaram o mínimo exigido pela Constituição em educação -25% da receita. Os números fazem parte do balanço mais recente do Siope, sistema eletrônico vinculado ao FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), que consolida as informações encaminhadas por prefeituras e governos.

"Ele tem que demonstrar o cumprimento [da lei]. Se não, as transferências voluntárias com órgãos do governo federal não podem ser efetivadas", afirma Paulo Malheiro, coordenador do sistema.
Mas há transferências que não são afetadas: convênios nas áreas de educação, saúde e assistência social podem ser feitas independentemente do cumprimento da regra.

Mas boa parte dos municípios e Estados conseguem garantir a continuidade dos repasses federais. Isso porque tribunais de contas de Estados e municípios consideram alguns itens como despesas em educação que não são avalizados pelo sistema.

É o caso do valor gasto com o pagamento de inativos da educação, aceito por tribunais no cálculo de investimento no setor, mas desconsiderado pelo Siope.
"É uma questão de interpretação", afirma José Clóvis de Azevedo, secretário de Educação do Rio Grande do Sul. Segundo números do Siope, o Estado investiu menos de 25% em educação nos últimos cinco anos -em 2010, o índice foi de 19,7%.
Segundo Azevedo, esse índice, porém, foi de 26,9%. Ele admite que dos R$ 4,8 bilhões destinados à educação naquele ano, R$ 1,2 bilhão foram pagos aos inativos do setor.

Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação destaca dificuldade em comprovar as informações encaminhadas pelos entes da federação. "O Siope é um avanço fundamental, mas está distante de refletir a realidade."
Presidente da CNM (Confederação Nacional dos Municípios), Paulo Ziulkoski alega que uma das formas de sanar o problema é aumentar a participação da União no financiamento do setor.

O aumento do percentual do PIB (Produto Interno Bruto) destinado à educação é uma das principais polêmicas do Plano Nacional de Educação, em debate no Congresso Nacional.
Entidades ligadas ao setor defendem uma reserva de 10% do PIB para a educação. Atualmente, esse percentual é estimado em 5%.

sábado, 2 de junho de 2012

Greve nacional dos professores


A Greve nacional dos professores das Universidades Federais


Por Mauro Iasi.
O Ministro da Educação, o senhor Aloísio Mercadante, se diz surpreso com a deflagração da greve nacional dos professores universitários federais. É compreensível, primeiro porque o MEC esteve ausente e omisso durante todo o processo de negociação ocorrido durante o ano passado e parece desconsiderar a real situação dos professores e as distorções da atual forma na qual se estrutura a carreira docente. Vejamos porque para nós a greve não só não surpreende como se apresenta necessária.          

Razões da greve
Há dois anos que os professores negociam com o governo seu projeto de careira docente e para tanto o ANDES construiu a partir de um amplo debate com a categoria um anteprojeto de lei no qual  é apresentada nossa proposta de uma carreira docente única com 13 níveis remuneratórios baseado no tempo de carreira, na titulação e na avaliação realizada com autonomia e por critérios objetivos definidos com fundamentos acadêmicos.

A posição do ANDES, que consideramos correta, é que nossa discussão salarial deveria ser feita com base em um projeto de carreira, ou seja, não nos interessa a mera discussão de um índice de aumento salarial ou de recuperação de perdas se não atacamos as raízes das distorções que dividem nossa carreira e geram desigualdades injustificáveis entre professores. Por exemplo, na concepção do governo a carreira dos docentes do ensino público federal se divide em ensino universitário e do ensino básico, técnico e tecnológico (que inclui os professores dos Colégios de Aplicação, ensino técnico de segundo grau, etc.) Sabemos das especificidades destes setores, mas segundo nossa visão são diferenças de função e não de profissão, somos professores do ensino público federal com diferentes atribuições dentro de uma mesma carreira.

Outra divisão, esta dentro do mesmo campo do ensino universitário, é aquela que compõe nossa atual carreira e que nos divide em professores auxiliares, adjuntos, assistentes e titulares, esse último constituindo uma carreira à parte que inclusive exige novo concurso. Ora, essa distinção se fundamenta e um pressuposto quase feudal, próprio de um modelo universitário anacrônico e autoritário em frontal contradição com o modelo de universidade e sociedade que defendemos. Sua base é a concepção de que existe um grupo de professores “donos” de certa área ou disciplina e que dão algumas aulas durante o ano comunicando seus estudos e pesquisas assim como seu acumulo teórico sobre um tema e são auxiliados por professores que o circundam como assistentes ou adjuntos e estes por auxiliares numa hierarquia que implica mais que uma divisão de trabalho uma lógica de poder.

Isso não faz sentido na realidade da universidade brasileira que desde a constituição de 1988 em seu artigo 207 estipula a articulação entre ensino, pesquisa e extensão. Na prática tal conformação divide a categoria em faixas remuneratórias que funcionam como um funil em que poucos podem chegar ao final da carreira e as salários maiores e a maioria fica presa nas faixas intermediárias. Segundo estudo promovido pela ADUFRJ, por exemplo, na UFRJ, mais de 80% se aposentam como professor adjunto 4.

A proposta inicial do governo criava mais um patamar que denominou de Professor Sênior, hoje retirada da proposta, extinguindo a carreira de professor titular, que impunha aos professores mais quatro degraus até o final da carreira e impunha critérios que fechava ainda mais a saída do funil.

Durante todo o ano de 2011 o ANDES acompanhou uma longa e tortuosa enrolação do MPOG que supostamente deveria debater as propostas apresentadas sobre a carreira buscando aproximações e diferenças visando chegar a uma proposta negociada. Sob uma série de pretextos o governo protelou as reuniões, quando não as desmarcou unilateralmente numa total falta de respeito ao que havia sido combinado. O fato que chegamos ao final do ano sem que um milímetro da negociação sobre a carreira docente houvesse sido acordado.

No final do ano passado o governo apresenta uma proposta emergencial, diante do impasse na negociação, que consistia basicamente em três pontos: aumento emergencial de 4% a ser pago seis meses adiante (em março de 2012); incorporação de uma das gratificações ao vencimento básico (GEMAS para ensino superior e GEDBT pra o ensino básico, técnico e tecnológico). Até maio deste ano o governo não havia cumprido sequer o acordo emergencial.

Uma greve em defesa da universidade pública: pela carreira docente, por salários e por melhores condições de trabalho.

O governo apresentou um Projeto Lei que incluía os termos acordados ao final de 2011 e o transformou em Medida provisória agora em maio (a MP 568). Ocorre que junto com o aumento de 4% e a incorporação das gratificações, agrega inúmeras medidas referente à várias categorias do funcionalismo que não foram negociadas e que pode gerar perdas para os trabalhadores, como é o caso da mudança do cálculo da insalubridade que afeta diretamente os médicos.

O acordo e seu injustificável atraso é insuficiente, neste sentido a greve dos professores não é apenas pelo seu cumprimento, na verdade uma obrigação acordada com o governo, mas pela imediata abertura de uma negociação séria sobre nossa carreira e pelo enfrentamento das causas que levam hoje à precarização do trabalho docente, das condições de trabalho e das instalações universitárias. Esse aspecto está ligado diretamente à expansão realizada pelo governo que não veio acompanhada dos recursos necessários para sua implementação gerando salas de aulas superlotadas, pressões para um aumento da carga horária dos docentes em sala de aula prejudicando a relação entre ensino, pesquisa e extensão, falta de professores,  precariedade de instalações.

Vários campus estão funcionando em espaços cedidos por prefeituras, salas improvisadas, sem laboratórios, equipamentos e instalações adequadas. Tudo isso tem acarretado vários problemas que vão desde turmas que estão ameaçadas de não se formar, como é o caso da medicina de Macaé que não tem hospital para que seus alunos façam a residência além da carência de professores em várias disciplinas.

Na verdade o sucateamento da universidade pública e a maneira como o governo entende o setor revela uma concepção de Estado que está na base do projeto de governo que se implantou em nosso país. Vivemos uma contra-reforma do Estado e uma clara opção pela lógica do mercado e das parcerias público-privadas que tem por centro e meta principal a formação de superávits primários sangrando o fundo público para colocá-lo a serviço dos interesses do grande capital monopolista. Não há uma crise da Universidade Pública, o que há é uma clara intenção de adaptá-la, destruindo-a, para que sirva aos interesses da lógica capitalista e do mercado.

Desta forma, o ensino público é concebido como um serviço oferecido que deve disputar o mercado e seus “clientes/consumidores” com as demais empresas do setor e para tanto deve assumir uma lógica gerencial fundada na “eficácia”, entendida como produzir o serviço com os recursos existentes e ter iniciativa de captar os recursos adicionais necessários. Daí as Universidades são incitadas a buscar recursos na iniciativa privada, seja através de projetos de parceria, financiamento de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico, através de fundações ou outras formas. Para os professores é pensado uma remuneração básica e uma concorrência entre seus pares no balcão de projetos e bolsas oferecidas pelas instituições de fomento ou pelas oportunidades do mercado, o que vem se tornando para boa parte da categoria a principal fonte de sua remuneração, ou, no mínimo, uma parte considerável de seus vencimentos.
Além desta prática quebrar a autonomia universitária e o necessário financiamento público, gera distorções e diferenças não apenas entre unidades da Universidade, com centros e unidades com grandes somas de recurso e outras com recursos abaixo do mínimo necessário, o que se reflete não apenas nas instalações, mas na própria capacidade de produção de pesquisas, intercâmbios e visibilidade de sua produção acadêmica e científica; como, também, entre os professores e sua remuneração.

A situação atual é produto desta opção. Por isso se explica o abandono de uma política, não de valorização dos salários, mas mesmo de sua recomposição. Se considerarmos os salários nominais entre 1998 e 2011 de categorias do serviço público federal que exigem a mesma formação e que se compõe de atividades similares, como por exemplo os profissionais de Ciência e Tecnologia e os pesquisadores do IPEA, temos que em 1998 os professores universitários recebiam R$ 3.388,31, os pesquisadores do  IPEA R$ 3.128,20 e do MCT recebiam R$ 2.6632,36. Em 2011 a situação se inverte de forma que os pesquisadores do IPEA ganham R$ 12.960,77, em segundo lugar os profissionais do MCT com R$ 10.350,68, e os professores passaram para a última posição com R$ 7.333,67, sendo a pior remuneração entre os funcionários públicos com este nível de formação exigido.

Isso considerando a categoria como um todo, pois as divisões as quais nos referíamos no interior da carreira existente e que permanecem na proposta do governo, fazem com que os aumentos oferecidos concentrem-se no alto da pirâmide e se diluam nas categorias intermediárias e na base. O secretário de relações do trabalho do MPOG, Sérgio Mendonça, por exemplo, alega que considerada no conjunto os professores  tiveram reposta a inflação do período relativo aos governo Lula e Dilma (cerca de 57,1 %). No entanto, considerando as diferenças, os extratos superiores da carreira, como professores titulares e assistentes 3 e 4, tiveram em media seus salários ajustados entorno de 15% acima da inflação, enquanto os adjuntos, faixa na qual se encontra a maior parte dos professores inclusive os aposentados, amargam uma defasagem que chega à 40% abaixo da inflação do período.

Para o governo esse não é um problema da educação, de uma política para universidade brasileira, mas um problema de gestão, não é por acaso que o principal negociador durante todo esse tempo não foi o MEC, um ilustre ausente e omisso nesse debate, seja com Haddad, seja agora com Mercadante, um político que traz no nome a marca de seu compromisso, mas o Ministério de Planejamento.

Os professores universitários são vistos como uma categoria privilegiada que trabalha pouco e ganha altos salários e a universidade um antro de maus gestores e de desperdício do dinheiro público, justificando o controle que rouba a autonomia universitária, uma limitação de recursos e o destino de completá-los no mercado e das parcerias, condenando a universidade a se transformar em uma central de serviços e os professores em mascates de projetos e que tem, se quiser cumprir os requisitos para ascender na carreira, que dar aulas (muitas aulas), participar de projetos de extensão, da pesquisa, da pós-graduação, além de participar dos espaços coletivos de gestão da vida universitária que se tornam cada vez mais homologatórios e formais.

O resultado disso é o adoecimento dos professores, a insegurança na carreira que é cada vez mais preterida roubando dos campos aqueles que poderiam contribuir para uma universidade pública e de qualidade, uma lógica perversa que sucateia a universidade pública para oferecer como saída sua mercantilização.

Por tudo isso os professores estão em greve, na maior greve do último período, pela defesa da Universidade Pública, pela defesa da carreira docente apresentada pelo ANDES-SN, por melhores condições de trabalho. Devemos isso ao pais, porque precisamos de uma universidade pública de qualidade, ainda que lutemos por mais que isso, para nesta universidade pública também se reflita os interesses dos trabalhadores e da maioria da população lutando por aquilo que chamamos da luta por uma Universidade Popular, e, por isso, a luta por uma Universidade Pública e por uma Universidade Popular é uma luta pelo socialismo. Devemos isso, também, a nós mesmos, os professores, porque merecemos respeito e precisamos resgatar nossa dignidade espezinhada por este governo de burocratas à serviço do grande capital monopolista que vê na Universidade mais oportunidade de negócios (como mostra a proposta da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares- EBSERH); mas, principalmente, devemos isso aos nossos queridos alunos que merecem uma educação de qualidade e uma verdadeira aula, aquela que demonstra que é somente no caminho da resistência e da luta que conquistaremos uma universidade melhor e caminharemos para superar a lógica do capital que está na base da proposta de universidade que se implanta.

Nós não podemos impedir que os exploradores se comportem como tal, da mesma forma que não nos cabe mudar o comportamento de seus aliados e serviçais que hoje no governo implementam o desmonte das políticas públicas, do Estado e, portanto, da Universidade Pública. Mas, podemos e devemos decidir não ser seus cúmplices e dizer em alto e bom tom: se quiserem destruir a Universidade Pública terão que fazer sem nosso consentimento, sem nossa omissão, terão que fazê-lo contra nós e isso não se dará sem luta.
***
Mauro Iasi é professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ, presidente da ADUFRJ, pesquisador do NEPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisas Marxistas), do NEP 13 de Maio e membro do Comitê Central do PCB. É autor do livro O dilema de Hamlet: o ser e o não ser da consciência (Boitempo, 2002). Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às quartas.