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quinta-feira, 1 de outubro de 2009

As desigualdades na escolarização no Brasil

Luiz Araújo

Tive acesso a uma publicação denominada "As desigualdades na escolarização no Brasil", fruto do trabalho do Observatório da Equidade do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social, órgão vinculado a Presidência da República.
O Observatório desenvolveu uma metodologia de monitoramento das políticas públicas, direcionando seu olhar para o impacto destas políticas na diminuição da desigualdade social em nosso país.

Infelizmente esta publicação não teve divulgação na mídia e não sei se tem sido considerada como instrumento de avaliação das políticas governamentais, mas levanta muitas questões relevantes para o processo de construção do novo Plano Nacional de Educação.

O Observatório trabalhou com alguns indicadores que caracterizam a desigualdade na escolarização no Brasil. O primeiro é que o nível de escolaridade da população brasileira é baixo e desigual. O segundo é a persistência de elevado contingente de analfabetos, reforçando desigualdades. O terceiro é que temos um acesso restrito à educação infantil de qualidade, sobretudo pelas crianças de 0 a 3 anos. O quarto é relativo aos níveis insuficientes e desiguais de desempenho e conclusão do ensino fundamental, com acesso limitado para alunos com deficiência. O mesmo indicador é válido para o ensino médio. Temos também a insuficiência da oferta de qualidade e desarticulação dos subsistemas de educação técnica e de formação profissional continuada.

Durante os próximos dias vou comentar os principais aspectos desta importante publicação.

Sexta-feira, 18 de Setembro de 2009

Escolaridade desigual

A PNAD 2007 atestou que a escolarização da população de 15 anos ou mais era de 7,3 anos de estudo em média, abaixo dos oito anos obrigatórios. O texto do Observatório afirma que "o acréscimo, entre 2005 e 2007, de apenas 0,3 anos na escolaridade média dessa população desprezível para um país que almeja o desenvolvimento com equidade e sustentabilidade".

Aponta as desigualdades escondidas nesta média. Para os que vivem na zona rural a escolaridade média é de apenas 4,5 anos. Na área rural do Nordeste este número cai para 3,7 anos. Neste ritmo a população rural levará mais de 30 anos para alcançar o nível da área urbana de nosso país. Um verdadeiro escândalo!

Outro dado alarmante: enquanto 52,5% da população urbana têm instrução completa de nível médio ou superior, no meio rural somente 17% alcançam esta escolaridade.

O documento do Observatório, talvez pelo peso da participação governamental, faz declarações muito otimistas sobre os possíveis efeitos na diminuição das desigualdades da efetivação do Fundeb e do PDE. Afirmam que "os recursos do Fundo ampliaram as condições para o funcionamento da educação básica". Sobre o PDE o documento afirma que ocorreu "um movimento estratégico de pactuação de metas e diretrizes com os municípios" e que o governo federal "ativou mecanismos de assistência técnica aos gestores" e direcionou "recursos diferenciados para escolas com baixo desempenho no IDEB".

Tais afirmações carecem de melhor análise, especialmente de um monitoramento da destinação de recursos orçamentários do governo federal para os municípios e o comportamento da execução orçamentária dos programas principais que compõem o PDE.

Como exemplo desta necessidade cito apenas dois dados relativos a execução orçamentária do MEC em 2009. O Programa Qualidade na Escola reúne as principais ações de infraestrutura originadas pela pactuação de metas e diretrizes com municípios e estados e tem 1 bilhão e 960 milhões disponíveis, mas até o dia 3 de setembro só haviam sido empenhados 10,6% e liquidados 3,72% deste recurso. E dos 42 bilhões 270 milhões o ministério havia conseguido aplicar e liquidar apenas 51,8%.

Segunda-feira, 21 de Setembro de 2009

A maior das iniquidades

O estudo do Observatório da Equidade, analisando os resultados das PNADs de 2005 e 2007, atesta que nos dois anos houve apenas uma redução de 1,1% na taxa de analfabetismo.

A importância do estudo é alertar para a diferença entre o urbano e rural no analfabetismo brasileiro; enquanto apenas 7,6% dos maiores que 15 anos estão nesta situação nas cidades, este número salta para 23,3 no meio rural.

Também as regiões mais pobres sofrem mais com este fenômeno, pois o Nordeste possui 14,8% de analfabetismo na área urbana e o absurdo número de 33,8% na área rural, ou seja, um a cada três nordestinos que vivem na área rural são analfabetos.

Esta desigualdade tem cor, pois entre os brancos o analfabetismo é de apenas 6,1% e entre pretos e pardos este número alcança 14%.

E apresenta uma informação pouco divulgada pela imprensa e pelo governo: a UNESCO está considerando o Brasil como parte do grupo de países em situação de risco quanto ao analfabetismo absoluto.

E conclui que deve se esperar "que, com prioridade governamental e social, sejam solucionadas os persistentes problemas que obstaculizam a redução da maior das iniqüidades sociais do Brasil: o baixo envolvimento do setor público e de gestores educacionais, os altos índices de evasão, o baixo rendimento do processo de alfabetização, e a pequena continuidade em programas de EJA entre os alfabetizados".

Esta mensagem tão clara tendo sido escrita por um órgão tão próximo do Presidente Lula deveria ter algum efeito na postura tímida do governo no enfrentamento de tão importante problema.

Terça-feira, 22 de Setembro de 2009

Infância desprotegida

Um dos problemas monitorados pelo Observatório da Equidade é o acesso restrito à educação infantil em nosso país. Pelos dados da PNAD 2007 tínhamos 44,5% das crianças de 0 a 6 anos estudando. Porém, este número é mais representativo do universo de 4 a 6 anos, onde a cobertura alcança 77,6%, mas a cobertura em creche continuava pequena, representando apenas 17,1% do universo.

E mais, o "atendimento de crianças de 0 a 3 anos cujas famílias recebem até ½ salário mínimo é quatro vezes menor do que o das crianças cujas famílias têm rendimento mensal médio acima de três salário mínimos".

A conclusão mostra a gravidade do problema: os mais pobres ficam fora do acesso à educação infantil, justamente o segmento social que mais necessita do serviço. O Brasil atende apenas 10,8% das crianças cujas famílias ganham até ½ salário mínimo. Esse percentual cai para 4,9% na região Norte.

Esta injustiça também aparece entre o urbano e o rural. Nas áreas urbanas o atendimento em creche alcança 19,6% e o de pré-escola o percentual de 80,4%. Já na área rural o atendimento em creche representa apenas 6,4% e o de pré-escola apenas 66%. O Norte atende na área rural apenas 2,5% da população na idade e o Centro-Oeste apenas 2,9%.

Há uma clara expectativa de que a inclusão das creches na distribuição dos recursos do Fundeb consiga reverter esta situação. Esta é realmente uma chance de elevação da cobertura, mas para isso seria importante que a remuneração das matrículas de creche fosse feita de acordo com o custo realmente verificado e não por um percentual insuficiente, como até agora foi feito.

Espero que meus comentários sobre o documento "As Desigualdades na Escolarização no Brasil" tenham sido úteis, seja para reconhecer bons trabalhos de monitoramento, seja para estimular o governo federal levar em consideração as suas próprias produções na hora de avaliar suas políticas públicas educacionais.

Quarta-feira, 23 de Setembro de 2009

Fonte: Blog do Luiz Araújo - http://rluizaraujo.blogspot.com/

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