Páginas

domingo, 1 de março de 2009

Prova busca legitimar contratação precária, afirma professora da FE-Unicamp





Em entrevista ao Observatório da Educação da Ação Educativa, a socióloga e professora da Faculdade de Educação da Unicamp, Aparecida Neri Souza, analisou a política educacional do governo do estado de São Paulo, a partir da realização de processo seletivo para a contratação de professores em regime precário. Fonte: Portal do Observatório da Educação

1 – A Secretaria Estadual de Educação aplicou em dezembro uma prova ao professorado da rede estadual com contratos precários para utilizar a nota como critério classificatório na atribuição de aulas deste ano letivo. Como avalia isso?

Primeiro, temos que ver a questão dos temporários da rede pública estadual. É um grupo enorme, chama bastante atenção. De 2000 a 2008, somente nos últimos três anos o número de professores temporários é menor que 50%. O dado é importante para mostrar que a Secretaria de Educação de São Paulo tem se pautado por política de contratos temporários. Mostra que não há política de contratação de professores por concurso público. Não há uma política que possa enfrentar, por meio de contrato, o problema de falta de professores em determinadas áreas. Na comparação com novembro, vemos em dezembro um contingente menor de professores. São demitidos todos os anos, em dezembro, cerca de 10 mil professores temporários. É mais um dado importante sobre a política de contratação de professores. Como se pode pensar na qualidade da educação com grupo tão grande de professores temporários?

2 – Então, independente da qualidade da prova há um problema anterior de política de contratação?

Há um processo de precarização do trabalho. Isso não é um movimento isolado. A política de ausência de concursos se insere num movimento muito mais geral que afeta todos os trabalhadores. Estou me referindo a um conjunto de situações de trabalho atípicas, muito expressivas a partir de 1990, quando se encontra muito esses tipos de contratos de trabalho atípicos. Esse trabalho precário indica ausência ou redução de direitos e garantias vinculados ao trabalho assalariado.

3 - A prova é parte dessa política?

A prova foi organizada com objetivo de medir conhecimento dos professores sobre a proposta curricular da Secretaria de Educação. O conhecimento sobre essa proposta curricular seria o elemento de classificação para distribuição do trabalho. No entanto, a prova não foi dirigida somente para os temporários, mas também para aqueles que queriam ingressar na escola pública. São 88 mil temporários. Candidataram- se para fazer a prova 212 mil. A mesma prova foi dirigida a todos: a contratados, com estabilidade pela Constituição - ainda que precária - e a quem pretende entrar no campo. Se é classificatório e o grupo é heterogêneo, com jovens que acabaram de sair da universidade, significa que certamente não ficariam os 88 mil. Ou seja, os professores perderiam imediatamente o trabalho, sem indenização nenhuma, sem seguro desemprego, sem os direitos que aqueles no setor público têm. Gostaria inclusive de fazer uma crítica à Apeoesp, que errou ao aceitar a participação de todos. Com isso, aceitou a proposta de demissão, que quem não tivesse aulas seria demitido. Já o Judiciário fez trabalho excelente: direitos conquistados devem ser mantidos.Essa proposta para distribuição de aula é de flexibilização de demissões. O Estatuto do Magistério deixa claro que o contrato temporário é para situação de excepcionalidade. E diz ainda que a admissão tem dois critérios: experiência e diplomas. A prova introduz a classificação mediante aferição de conhecimento da proposta curricular do estado de São Paulo colocando em cheque direitos conquistados pelo Estatuto.

4 - Que conseqüências a precarização pode trazer ao sistema?

É preciso pensar em três questões: ausência de concursos, flexibilização de demissões e supressão de direitos. Assim a gente percebe que a precarização do trabalho docente possibilita descontinuidade nas relações de trabalho na escola, imprevisibilidade de rendimentos oriundos do salário e dificuldade de construir projetos pela rotatividade do grupo. Ou seja, as conseqüências de ter política que valoriza o trabalho temporário em detrimento do formal mediante concurso público são gravíssimas para a qualidade da educação. A prova aplicada pela SEE legitima essa precariedade, porque assume que essa é a forma legítima de contratação: a temporária.

5 - A prova evidencia uma política pública que não concebe a valorização do magistério como componente da qualidade do ensino?

Sim. A construção de coletivos de trabalho se dá mediante um processo de construção de um corpo estável de professores, recrutado mediante concurso público. Há uma questão gravíssima: num documento de 30 de janeiro, a secretária de Educação informa que professor podia escolher até duas disciplinas para fazer a prova, segundo sua aptidão. Como assim? Segundo aptidão, não segundo a formação profissional, o diploma?Os professores ministram disciplinas para as quais não são formados. Não dão aulas segundo sua formação. Os professores efetivos podem também ministrar aulas em campos de atuação diversos. O que é isso? Legitima que professores sem formação específica possam ministrar aulas em campo de atuação diverso. A questão da não realização de concursos públicos e distribuição de aulas contribuem para esses arranjos informais. Somente 65% dos professores do estado de São Paulo são formados para ministrar português. Como melhorar qualidade de ensino com política que contribui para a precarização do trabalho?

6 - O que pensa especificamente da prova aplicada?

Não sou contra processos de avaliação. Desde que não signifiquem desemprego, mas que permitam aos professores se conhecerem. Avaliação não pode ser punitiva. Segundo as notícias, metade dos professores seria substituída. Isso pode confirmar que a aplicação tinha a intencionalidade de renovar o quadro, era instrumento de demissão, não de avaliar quem são esses professores. O Estado é o responsável pela regulação do sistema público do ensino. Portanto, a formação de professores é também de responsabilidade do Estado, que deve ser responsabilizado por resultados ruins em avaliação. Para além disso, há que se questionar ainda a prova que foi aplicada. Olhei a de sociologia, minha área, e há questões mal formuladas, em que várias alternativas podem ser consideradas corretas. Na 11, levei um susto. É preciso perguntar por que aquela alternativa foi apontada como correta. Já a pergunta 15 tem recorte ideológico pela resposta do gabarito. As perguntas são muito estranhas. A proposta curricular da Secretaria de Educação para

Nenhum comentário:

Postar um comentário